MENSAGEM DE CELULAR
Quer
namorar comigo? Após ler a mensagem, ela segura o celular com umas das mãos e
com a outra tapa a boca entreaberta; reação de quem recebe um pedido inesperado
e é contemplado por um misto de sensações. Um turbilhão de pensamentos lhe
acalora esperanças automaticamente expungidas.
Quem
nunca recebeu um torpedo com um conteúdo que lhe agitasse as estruturas
físicas? Que atire o primeiro celular... Um convite para sair de alguém que você nem
imaginava ter o seu número; um lembrete daquela reunião importante e super
chata com o chefe; a conta de luz em atraso; a fatura do seu cartão de crédito;
um aviso de despejo, e se duvidar umas piadas sem graça sobre papagaio,
português e viado que ao invés de descontrair deixa qualquer um puto (esse
ultimo você ainda tem que pagar 2,99) e ria se puder. Porem um pedido de namoro
a essa altura da banalidade sentimental onde pessoas “ficam”, e o prazer passa
a ser eterno enquanto duro... foi no mínimo excêntrico.
-
Simmm! Ela irrompe o silêncio, desengasga, volta a terra, finca os pés na cabeça
e berra como se estivesse atendendo a uma ligação. Euforicamente controlada senta-se numa cadeira
ao lado da mesa do escritório em que trabalha, e ali, depois de uma longa
respiração a Leninha escreve a resposta. - Sim, sim, sim! Eu quero namorar com
você! Ela mantém o celular e os cotovelos sobre a mesa, as suas mãos
comprimindo o rosto numa atitude desesperadora, balbucia de si para si do seu
jeito típico de falar – Anda, vai! Vai! (lhe baixou um espírito narrador de
futebol numa final de campeonato) Avemaria cheia das graças, essa mensagem vai
não é? A cartinha que simboliza o texto em transferência não para de passar
diante de seu olhar estático. “Erro”. Tentar novamente? Levantando-se de
maneira brusca e visivelmente irritada ela aponta para o aparelho na loucura de
que ele a escute atentamente e compreenda a urgência de sua mensagem. Começa a
falar: - Tentar novamente? Se eu quero tentar novamente? De que lado você está
seu idiota? Ela estava indiscutivelmente perturbada. – Que pergunta imbecil!
O
desequilíbrio emocional da Leninha tinha um nome: Anselmo. Apontado
por todos como o tipo grosso, insensível. Porem ela adorava um homem brabo e
domá-lo era o seu sonho de consumo. Um cavalo puro sangue, grande, forte e
arredio lhe pedia em namoro quando simplesmente poderia lhe tomar nos braços
com volúpia e arrancar-lhe muito mais que um beijo (a roupa faz parte dos itens),
deixa de lado o instinto selvagem e romanticamente lhe escreve um torpedo. Esse
é o supra-sumo que lhe acendeu uma sangria desatada. Com toda a pompa da
palavra, a louca “pirou” de vez.
Com
as mãos na cintura e andando ininterruptamente em circulo pela minúscula sala,
ela busca no âmago as palavras certas para dar continuidade a sua retórica com
aquele ser inanimado e burro. Precisava extravasar sua indignação, convencê-lo
de que, mais que querer, era necessitar. Continua:
- Olha aqui, eu não admito que logo tu,
paraguaio de merda, três chips, Bluetooth, acesso a internet, mp3, mp4, 5, 6.
TV, rádio, e bomba de nêutron, tantas
vezes testemunha auricular desse meu desatino amoroso, desse impasse afetuoso,
essa relação esdrúxula, seja do contra. Essa foi a mensagem mais linda e
inacreditável que recebi desde o dia que te comprei numa esquina da lapa sua
muamba rosa. Não estrague tudo agora! Agarrando o indefeso com força, deu duas
sacudidas e acrescentou: _ Nada de mensagem, vou ligar pra ele!
Respirou fundo, mãos tremulas, mal conseguia
lembrar o numero e quando finalmente aperta o verde: - Seu saldo é insuficiente
para fazer ligação...
Zanna Santos